terça-feira, 27 de setembro de 2011

Critóvão Tezza - O filho eterno





A OBRA
Um homem de letras, revisor de textos, aspirante a escritor, tem um primeiro filho que nasce com Síndrome de Down. A história de O Filho Eterno vai girar em torno da lenta aceitação desse filho e das dificuldades de ser pai de uma criança que não amadurecerá como as outras crianças. O que se vê, na verdade, é que, mais do que a criança, é o pai quem precisa amadurecer.
Em linhas gerais, o enredo é muito modesto. Após a rejeição inicial do filho, e até a fantasia por parte do pai de que a criança possa não sobreviver, temos a negação da diferença (o pai matricula Felipe em uma escola comum), depois um afastamento físico (o pai vai lecionar em Florianópolis), até a lenta aceitação da paternidade de uma criança especial e que vai começar com o retorno do pai a Curitiba.
Por fim, vai se estabelecer uma relação de comunhão e amor entre pai e filho, ancorada especialmente no futebol, que dará a Felipe a noção ainda que precária de tempo e de objeto a que amar.

COMO LER
Importância do livro: contato com a prosa contemporânea brasileira, especialmente nos recursos de linguagem. Há ainda a importante discussão da paternidade de uma criança com características especiais.
O que o vestibulando deve observar: os planos temporais do livro. Ele é narrado no presente, mas faz muitas incursões no passado (flashbacks da vida do pai) e também alguns deslocamentos para o futuro (dizendo o que ocorrerá com as personagens).
O pano de fundo histórico: anos de chumbo (Ditadura) _ redemocratização _ descrença na política contemporânea.
O título: o filho é eterno porque a criança não tem noção da cronologia, está fora do tempo como nós o conhecemos. Desse modo, não haverá o natural processo da relação entre pais e filhos (os pais cuidam dos filhos e um dia velhos serão por eles cuidados).
Dificuldade do livro: idas e vindas do narrador. Por vezes, ele recorre ao uso do discurso indireto livre, passando a palavra ao pai, o que parecerá uma narrativa em primeira pessoa.
Como entender o personagem principal: lembre-se de que o personagem é um homem de letras e que haverá muitas referências literárias ao longo de O Filho Eterno.
Uma chave de leitura: falou-se muito em uma narrativa de cunho autobiográfico, o que não pode ser totalmente descartado uma vez que Cristóvão Tezza também tem um filho com Down e que se chama Felipe, além de uma série de outras coincidências. Não se esqueça, porém, que se trata de uma reelaboração literária, ou seja, ficcional.

http://wp.clicrbs.com.br/clicvestibular/2011/08/10/os-livros-da-ufrgs/?topo=77,1,1,,,77, em 27/09/2011.

João Cabral de Melo Neto - A educação pela pedra



A obra
Obra da maturidade do poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto, A Educação pela Pedra potencializa algumas questões muito caras ao poeta, como o apuro formal, o gosto pela arquitetura do verso, e um caminho para o mundo externo que seria quase a anulação do sentimento lírico clássico (o que fala da subjetividade), criando uma espécie de antilira.
O livro se divide em quatro partes, cada qual com 12 poemas: Nordeste (a), Não-Nordeste (b), Nordeste (A), Não-Nordeste (B). Vale atentar que essa simetria é puramente intencional por parte de João Cabral. Só para ilustrar a questão, as partes com letra minúscula têm poemas de 16 versos, ao passo que as de letra maiúscula, 24. Além disso, como um todo se pode perceber uma homenagem ao barroco na quantidade de duplos e antíteses nos poemas, somado a uma aridez temática, tão bem representada no título. Ocasionalmente, pode haver ironia e humor em alguns poemas da obra.
Valeria destacar para os vestibulandos alguns poemas que servem tanto como chave de leitura para os demais como também de exemplo das características do livro.
Entre eles estariam: A Educação pela Pedra (discussão sobre o fazer poético), Catar Feijão (uma reflexão sobre a dureza das palavras), Tecendo a Manhã (a poesia e a literatura vistas como uma comunicação entre textos), Duas Bananas & a Bananeira (descrição do sertão), O Mar e o Canavial (símbolo das tensões e antíteses que ocorrem com frequência no livro).

Como ler
- Importância do livro: trata-se de uma obra significativa de um dos grandes poetas da modernidade brasileira.
- O que o vestibulando deve observar: a presença do sertão nas partes nordestinas e a experiência da vida na Espanha, nas partes não nordestinas. É preciso muita atenção com a busca por uma linguagem plenamente adequada à temática, em outras palavras, a perfeita integração entre forma e conteúdo.
- Dificuldade do livro: trata-se da obra mais complexa selecionada pela UFRGS. Recomenda-se paciência na hora da leitura e pelo menos duas ou três leituras para cada poema.
- Uma chave de leitura: guarde em mente a importância do número 4 e da simetria entre os poemas para João Cabral. O título é bastante sugestivo para buscarmos a compreensão das intenções do poeta. Que educação seria esta que a pedra tem a nos oferecer? Um último ponto importante é aceitar o aspecto inovador e de ruptura dos versos cabralinos, se não na forma, na intenção de buscar uma objetividade extrema, evitando todo e qualquer sentimentalismo da poesia mais simples.

http://wp.clicrbs.com.br/clicvestibular/2011/09/23/leituras-obrigatorias-da-ufrgs-a-educacao-pela-pedra/ em 23/09/2011.

História do cerco de Lisboa - José Saramago



A OBRA
Raimundo Benvindo Silva é um revisor de textos, solteiro, com mais de 50 anos, alguém que luta para manter sua integridade desde uma posição de humildade social e econômica. No início da narrativa, ele revisa um livro chamado História do cerco de Lisboa. O livro narra a tomada de Lisboa em 1147, então em posse dos mouros, pelas forças portuguesas com a ajuda dos cruzados que seguiam para o oriente e a Terra Santa. Raimundo, contudo, discorda de várias informações históricas contidas no livro. Enquanto termina a revisão, Raimundo fantasia com a verdadeira história daquele cerco, com os detalhes omitidos pelos livros de história. Cresce sua vontade de romper com o mandamento máximo dos revisores, que é não intervir no conteúdo do texto. É quando a tentação de se fazer notar escapa ao seu controle: ele acrescenta um NÃO em uma frase decisiva do livro. Os cruzados decidem NÃO ajudar a tomar Lisboa, contrariando a História oficial. Espera que alguém talvez perceba o seu ato a tempo, mas o livro vai para a gráfica sem que o acréscimo seja notado. Somente 13 dias depois é chamado na editora para prestar contas. Após ser questionando por que fez o que fez, ele acaba alegando uma espécie de insanidade temporária. Aparece então Maria Sara, uma profissional contratada pela editora para evitar esses erros. Raimundo se envolverá com ela e aceitará sua proposta de reescrever a História do Cerco considerando o NÃO que ele acrescentou. Na história de Raimundo, surgem dois personagens que se apaixonam durante o cerco, o soldado Mogueime (que serviu de escada para seu capitão Mem Ramires na tomada de Santarém) e Ouroana, uma barregã (concubina), que chega ao cerco acompanhando seu senhor, um cruzado alemão de nome Henrique. No plano do presente do livro, Raimundo e Maria Sara começam a viver sua história de amor. No plano da Lisboa sitiada, antes da conquista, Mogueime e Ouroana, agora desimpedida (ainda que assediada por outros homens importantes), se aproximam e passam a viver uma história de amor. A casa de Raimundo, que nunca tinha conhecido mulher senão a diarista (Maria), recebe agora as visitas de Maria Sara. A sobreposição do plano da história com o plano do presente é frequente ao final do livro, assim como o paralelo entre os casais.

COMO LER
Importância do livro: a discussão entre a proximidade do texto histórico e do texto ficcional, sendo ambos organizações deliberadas dos fatos, tentativas de explicar o mundo. O que o vestibulando deve observar: o gesto transformador de Raimundo Silva, que, a partir do NÃO, passa a ter importância para si mesmo e para o outro (Maria Sara). Dificuldade do livro: a linguagem e a técnica de Saramago, seja pelo uso inusitado da pontuação nos diálogos, seja pelos vários planos em que se desenrola o livro. Como entender o livro: é preciso pensar que são três histórias do cerco de Lisboa: a do autor que tem seu texto alterado por Raimundo; a do próprio Raimundo, que aceita o desafio de Maria Sara; e a do narrador do livro, que é na verdade a única das três histórias a que temos acesso. Uma chave de leitura: é preciso ler o livro com muita atenção. Depois dos primeiros capítulos, que são os mais difíceis, a trama fica mais clara.

http://wp.clicrbs.com.br/clicvestibular/2011/08/17/livros-da-ufgrs-historia-do-cerco-de-lisboa/ em 23/09/2011.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Moacyr Scliar - O Centauro no Jardim



A obra
Guedali Tartakovsky é um menino judeu que nasce metade homem, metade cavalo, como a mitológica figura do centauro. Criado por sua família em uma fazenda afastada (para evitar escândalos), enfrentará uma série de aventuras até conhecer uma outra centaura, Tita, com quem terminará por se casar mais tarde.
Surge então a possibilidade de uma cirurgia transformadora no Marrocos, que possa livrá-los da parte equina. O quarto traseiro é praticamente extirpado, restando as duas patas dianteiras. Para que possam caminhar com os cascos,usam botas ortopédicas especiais.
Depois disso, o casal vai viver em São Paulo (a mãe de Guedali tem dificuldades em aceitar uma nora que não seja judia), onde Guedali consegue vencer na vida.O casal tem filhos gêmeos que nascem plenamente saudáveis. Fazem amigos, em especial o casal Paulo e Fernanda.
Aos poucos, as lembranças da vida como centauro começam a atormentá-lo. Chega, por fim, a regressar ao Marrocos em busca de uma cirurgia reversiva. Lá conhece uma esfinge com quem mantém relações, que acaba escapando de sua jaula e sendo morta. Guedali retorna sem fazer a cirurgia.
Um dia, seus cascos se rompem, surgindo dois pezinhos (o couro já vinha se afinando e se transformando em pele).
A história termina no mesmo restaurante em que o livro começara, já no presente da narrativa (1973). Nesse momento, porém, ouvimos a versão de Tita para a história dos dois, que contradiz a versão que lemos até agora: Guedali nunca teria sido um centauro - nascera com uma deformação e depois um tumor o levara a crer que era um diferente.

Como ler
- Importância do livro: romance importante dentro da ficção contemporânea, em especial por seu caráter alegórico e pelo retrato da imigração judaica no sul do Brasil. Além disso, uma justa homenagem a Moacyr Scliar, recentemente falecido.
- O que o vestibulando deve observar: a impossibilidade em determinar se Guedali é ou não um centauro no sentido realista. Tal questão deve ser vista com autela, pois mais importante é admitir que muitas leituras são possíveis: a simbólica, a alegórica, fantástica e até realista (Guedali nunca foi um centauro senão para si mesmo).
- Dificuldade do livro: o livro não apresenta dificuldades de leitura quanto à compreensão do texto, como ocorre em outras das leituras obrigatórias.
- Como conhecer o personagem principal: lembre-se que Guedali é, antes de mais nada, alguém em busca de sua identidade: judeu/brasileiro, gaúcho/paulista, campônio/citadino, homem/centauro.
- Uma chave de leitura: Scliar segue a tradição da narrativa fantástica (Kafka, Cortázar), família de escritores para os quais a realidade não é mais que um espaço para o improvável, para o onírico, para o absurdo que, ao contrário das fábulas, pode ocorrer à luz do meio-dia.
http://wp.clicrbs.com.br/clicvestibular/2011/09/16/o-livros-da-ufrgs-o-centauro-no-jardim/, em 16/09/2011.